04 dezembro 2006

O Atentado Acidental

Esta semana falou-se muito do acidente de Camarate em que morreram Sá Carneiro, e Amaro da Costa. Não, não me enganei, escrevi acidente de propósito porque estou mesmo convencido de que foi um acidente

Tenho consciência de que, actualmente, a tese de atentado tem muito mais popularidade. É natural! Quando há duas teses em confronto e, uma delas, tem um lobby, não muito forte mas muito persistente por detrás, acaba por ser dominante! Mas não foi sempre assim.

Eu já tinha 29 anos quando o acidente se deu. Lembro-me perfeitamente que, quer a Procuradoria-geral da República, quer Freitas do Amaral, a exercer as funções de 1º Ministro, vieram poucos dias depois esclarecer que não havia qualquer indício de atentado! Conclusão que se manteve quando a polícia deu por terminada a investigação. Só que, uma coisa são as conclusões a que se chega racionalmente, outra são as “conclusões” de quem já tinha decidido, anteriormente, que se tratava de atentado. Confrontado com o resultado da investigação, o lobby do atentado, virou-se para a Assembleia da República, onde conseguiu que fosse nomeada uma comissão de inquérito ao “caso Camarate”.

Sempre achei estas comissões um absurdo! A Assembleia da República tem 3 funções – fazer leis, aprovar o programa do governo e fiscalizar a sua acção. Em nenhuma delas cabem comissões de inquérito a acidentes ou atentados, por muito ilustres que sejam as vítimas! Além disso, os deputados não têm qualquer formação especial para orientarem investigações nem os serviços da assembleia estão para aí vocacionados. Então, qual é a lógica de criar estas comissões a não ser para ter uma voz credível e que se possa manipular?

Apesar disso, a primeira comissão terminou sem conclusões claras. Mas os radicais da tese do atentado não desarmaram: pouco tempo depois conseguiram que fosse criada nova comissão. Que também não chegou a qualquer conclusão. E de comissão em comissão já vamos na 9ª (creio).

A primeira comissão que deu como provado o atentado foi a 5ª. E também foi a protagonista de uma das cenas mais ridículas de toda esta história: compenetrados do seu papel de investigadores, os senhores deputados resolveram ir visitar o armazém onde ainda estavam guardados os destroços do Cessna acidentado. Já tinham passado muitos anos, já não havia muito cuidado para impedir que os destroços fossem contaminados por outros objectos guardados no mesmo armazém, etc, mas, mesmo assim, os senhores deputados lá foram. A meio da visita, um dos senhores deputados pegou num destroço, ao acaso, e pediu para que fosse examinado no laboratório. Então não é que esse destroço apresentou vestígios de explosivos!!! Que se saiba foi o único. Nem comento! Essa comissão terminou com a audição, com pompa e circunstancia, na Assembleia, de um especialista internacional em terrorismo e atentados, que chegou de manhã, falou de tarde e saiu a tempo de apanhar o avião da noite. Com base em tão valioso testemunho concluiu-se pelo atentado. Entretanto, as conclusões de dois especialistas em acidentes de aviação, que estiveram em Portugal alguns anos antes, e que levaram mais de uma semana a examinar os destroços, foram esquecidas. Talvez porque concluíam que nada indicava ter havido atentado?

Agora, em mais um aniversário do acidente, os irredutíveis defensores do atentado clamam finalmente vitória. Um dos envolvidos no “atentado”, um tal José Esteves, confessou à Focus ter feito a bomba de Camarate. E pronto, eis os irredutíveis felizes.

Mas… quem é José Esteves? Foi comando em Angola, operacional de rede bombista após o 25 de Abril, guarda-costas de Freitas do Amaral e bruxo (não, não estou a brincar). Mais recentemente, aderiu ao islamismo e proclamou ligações à Al-quaida. Tão credível personagem, foi presa no próprio dia pela polícia judiciária, não por causa do caso Camarate mas porque era suspeito de ter colocado ossadas junto às instalações da SIC, de, vestido de árabe, ter ameaçado fazer-se explodir dentro das instalações da Procuradoria Geral da República e por ter colocado panfletos com dizeres em árabe, junto de bebidas à venda em grandes superfícies! A própria versão que José Esteves conta à Focus é mirabolante: Teria sido Amaro da Costa a pedir-lhe para fabricar a bomba, destinada a ser colocada naquele aparelho no dia anterior, para provocar um susto ao General Soares Carneiro que o usou numa deslocação. Este estava em campanha para a Presidência da República apoiado pela coligação PSD-CDS, mas estava a correr mal e Amaro da Costa esperava, assim, inverter a tendência de voto. Francamente, apresentar isto como prova envergonha qualquer um que não esteja desesperado.

Não tenho nenhum interesse especial na tese do acidente. Mas enquanto me contarem histórias da carochinha deste calibre…

3 Comments:

Blogger Jorge P. Guedes said...

Caro Pseven:

Você defende que terá sido acidente e argumenta bem.
Do que relata e também me recordo, resulta uma gritante falta de provas sérias, credíveis pelo menos, que suportem a teoria de crime.
Mas, repare, faltam provas.
Mas nada nos garante que tenha sido um acidente.
O aparecimento em cena do bruxo "SÔ ZÉ", um escroque de todo o tamanho, é mais um episódio a juntar a outros protagonizados pela mesma sinistra figura que deveria estar a prestar contas à sociedade pelos actos cometidos.
Sempre que se aproxima Dezembro, o sacripanta surge das trevas e há sempre um pasquim que lhe compra as mentiras.
Quanto a esse figurão, nada haverá que acrescentar.

Na minha opinião, e em tese, quando há uma morte por causas não identificadas deve pôr-se sempre a hipótese de dolo. Aí, investiga-se a quem é que o presumível crime poderia aproveitar.
Como, ao longo destes anos, não vi nenhuma investigação tornada pública abordar este aspecto, continuo a pensar que ambas as teorias são de equacionar e não excluo nenhuma. Julgo mesmo que nunca se saberá onde está a verdade.

Gostei da forma como escreve e põe a questão.
O Con(tro)versas tem um nome "bene trovato", como dizem amigos italianos, e este artigo seguiu bem o que o título do blogue sugere.
Outros temas são actuais e do interesse geral.
Nota-se que tem prazer pela escrita.Continue.

Saudações blogueiras.

Jorge G - O Sino da Aldeia

6/12/06 17:29  
Blogger Jorge P. Guedes said...

Então... foi tudo para fora?

Ó gente!

Um abraço, PSeven.

Jorge G

8/12/06 16:38  
Blogger PSeven said...

Jorge,
Desculpe a falta de resposta. É que tenho estado tão ocupado!

Quanto ao tema: não estamos muito distantes na nossa opinião. Só que, eu, talvez por causa da minha formação científica, acho que na ausencia de indicios credíveis de atentado, e passados todos estes anos, já era tempo de encerrar o assunto.

Um abraço ao sineiro

11/12/06 09:42  

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